Com o aumento exponencial de ações contra médicos, necessário se faz esclarecer alguns pontos para que o profissional saiba seus direitos e suas possibilidades frente a tal situação.
Observa-se cada vez mais que a relação médico-paciente pautada em um vínculo de confiança, vem se transformando em uma relação meramente consumerista. Relações cada vez mais superficiais, publicidade indevida que gera expectativa de resultado, falha na comunicação e no dever de informar, são alguns dos grandes fatores que corroboram para o aumento da judicialização da saúde.
Não obstante a isso, o médico é cobrado, muitas vezes, como se tivesse obrigação de um resultado impecável, como se devesse necessariamente alcançar a cura ou atender a expectativa do paciente frente ao tratamento proposto.
Felizmente, da perspectiva jurídica, tem-se que a obrigação do médico é de meio, não de fim.
Isto significa que o profissional deve buscar com esmero profissionalismo o resultado esperado pelo paciente, no entanto, tendo em vista que a medicina não é uma ciência exata, alcançá-lo de fato foge da responsabilidade do médico.
Por este motivo, para que a responsabilidade civil do médico seja apurada, necessário se faz a comprovação de culpa, conforme estabelece o art. 14, § 4º do Código de Defesa do
Consumidor:
Art. 14 – O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
(...)
§ 4º – A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.
Isto significa que, para que o médico seja responsabilizado civilmente pelo dano causado, há que se comprovar que o mesmo agiu com negligência, imperícia ou imprudência. No entanto, é importante ressaltar que, tendo em vista a hipossuficiência técnica do paciente, o ônus da prova no processo judicial é invertido. Assim sendo, por força do art. 6º, VIII, do CDC a jurisprudência vem transferindo ao médico o encargo de demonstrar a boa conduta profissional, comprovando que exerceu sua profissão dentro dos protocolos técnicos aplicáveis.
Por isso, é essencial que os profissionais elaborem com primor os documentos médicos. A elaboração de um bom prontuário médico, por exemplo, evoluído de forma detalhada, é uma excelenteferramenta de prova da boa conduta profissional. Muitos médicos não evoluem o prontuário de forma detalhada, utilizam siglas não conhecidas ou abreviaturas pessoais, o que dificulta o entendimento em eventual demanda judicial. Todas as informações ali contidas devem estar registradas de forma clara e precisa.
O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) é um documento indispensável na atuaçãomédica. O TCLE é um reforço do dever informacional e deve ser elaborado “sobre medida” para cada procedimento e paciente, contemplando suas especificidades e individualidades E vale uma ressalva: fuja de modelos prontos da internet e não se sintas seguroapenas com os termos disponibilizados nos hospitais, muitas vezes genéricos e geralmente assinados no momento da internação. Documentos genéricos e padronizados não cumprem com sua função essencial de respeitar a autonomia do paciente, pela ausência de explicações claras para permitir que o mesmo decida se submeter ou não ao procedimento/tratamento indicado.
Desta forma, recomenda-se que o médico possua seu próprio TCLE, elaborado com uma linguagem clara e acessível. Este deve ser apresentado em tempo hábil para que o paciente decida se submeter ou não ao tratamento, em um diálogo dinâmico onde o profissional esclareça todas as possíveis dúvidas que venham a surgir.
Cuidados como este podem reduzir consideravelmente o risco de ações, visto que traz transparência e maior proximidade entre o médico e seu paciente. Ainda assim, em caso de eventual ação, estes cuidados reforçam a qualidade das provas para uma defesa mais robusta e eficiente.